terça-feira, 29 de março de 2011

Uma carta.... Um desabafo....

Prezado Sr. Excelentíssimo Governador do Estado do Rio Grande do Sul.
Essa carta não é um choramingo de uma pessoa que começou agora a se aventurar na vida. Ando pelo estado e regiões há algum tempo e só quero te propor um desafio: que o senhor viva um dia da minha vida.
Gostaria que o senhor ganhasse o meu salário uma vez, o que certamente não seria suficiente pra pagar nem um sutiã de sua mulher. Ou então que levasse uma marmita ao Palácio do Governo, sem direito a vale refeição, e me contasse como é não almoçar em restaurantes com preços exorbitantes nos quais o senhor não precisa pagar a conta (pois quem paga sou eu).
Claro que o senhor sairia do Palácio para uma reunião do outro lado da cidade com seu terno italiano e seu sapato engraxado, disso eu não te privarei. Mas vá de transporte público às sete da manhã, talvez chegue a tempo se a reunião estiver marcada para às onze. Talvez (e eu espero muito que isso aconteça) o senhor sinta muita raiva quando, andando com sua roupa toda suada procurando o endereço certo, passar um helicótero sob a sua cabeça, desfrutando uma realidade que pelo menos hoje não é a sua.
Quando o senhor chegar no trabalho, exerça bem as suas funções. E não se esqueça que, caso não chegue na hora, seu patrão (que no caso serei eu), dificilmente entenderá o seu atraso, não importa se o ônibus quebrou ou se o senhor, tão desacostumado com esse contato homem-a-homem (não o das eleições, o de verdade), passar mal no ônibus apertado. Apertado não, porque segundo o senhor está tudo excelente.Que se sinta seguro em sair para a rua, dirigindo um veículo sem as condições mínimas de segurança, ou portando um revolvér da década de 50, enferrujado, com apenas  seis munições, sabendo que poderá enfrentar bandidos fortemente armados, até usando fuzil. Aliás, sem falar no colete à prova de balas, vencido. E no final do mês receber um salário de fome, que não dá nem para pagar a metade das contas, o que lhe custará, horas a mais no bico, após horas e horas cansativas de serviço, arriscando ainda mais a sua vida, perdendo a oportunidade de estar com sua família, com seus filhos.
E como se não bastasse, ter que ouvir desaforo de alguém que não entende nada de segurança pública, mas que quer ensinar você a trabalhar, além de chamá-lo de incompetente, mesmo você tendo arriscado seu mais valioso bem: a vida, em detrimento da segurança e da tranqüilidade da família deste cidadão.
Caso consiga chegar a tempo na faculdade (particular, que o senhor pagaria com o seu salário, sobrando cem reais pra viver o resto do mês), não se esqueça de passar no Diretório Central dos Estudantes e guerrear um pouco com os dinossauros burocráticos em prol dos estudantes que dificilmente se lembrarão de você daqui a seis meses. Ironia, não? É bom pra revigorar um pouco os ânimos.
Na hora de ir embora, não que eu te deseje tanto mal assim, mas tomara que chova. Se o pé do senhor ficar molhado, agradeça, afinal, água até as canelas é melhor do que água no umbigo. Gostaria que o senhor sentisse fome também, mas tudo estivesse um caos e justamente nesse dia o senhor só tivesse dez centavos na carteira. Dessa vez o meu dinheiro não poderá financiar nem uma coxinha. E, se o senhor demorar cinco horas a mais pra chegar no Palácio, anime-se, sua esposa estará lhe esperando com o jantar, que será também a marmita de amanhã.
Na verdade, pensando bem, eu desejo que não seja só um dia, sejam dois. Só pra ter o prazer de ver a cara do senhor sabendo que no dia seguinte começa tudo outra vez.

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